Artigo de João Carlos: Trajetória de Vida – Memorial III – Política

“Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a primavera inteira”. Ernesto Tchê Guevara.

João Carlos da Silva Costa Leite*

Minha vida foi moldada, plasmada, definida, por inúmeras concepções. A pessoa que hoje fala, escreve, chora, ri, briga, abraça ,beija, debate, grita, cala, adoece, caminha, morre aos pouco, etc, etc..é a colagem multiforme  de conceitos, conhecimentos, aspectos, erros/ acertos, inerentes a uma  trajetória única e exclusiva a todos da raça, denominada  humana.

João Carlos

Acredito que o Esporte, a Religião e a Política, não necessariamente nessa ordem, tiveram a função precípua de esculpir, dentre tantas outras experiencias/conceitos/ categorias, a personalidade deste ser que no tempo e espaço está aqui hoje, agora.

Com base nessa visão, resolvi escrever três artigos, que qualifiquei de capítulos memoriais, dissertando sobre cada um desses temas. Na oportunidade estarei também trazendo à tona concomitantemente, lembranças, memórias, recortes da minha existência.

POLÍTICA

Nasci no dia 15 de dezembro de 1961, estava no poder municipal o senhor Benedito Silva Gomes, o Bibi Gomes, quarto prefeito na ordem geral, e o terceiro eleito pelo voto popular. O Antecederam Manoel Antonio da Silva – , escolhido para governar provisoriamente -, Aniceto Mariano Costa e João Amaral da Silva – o Juca Amaral-, eleitos diretamente por votos em urnas.

Diferentemente de Viana, onde inúmeros pequenos grupos gravitam no espaço de poder, isto é atestado a meu juízo, por Astolfo Serra na sua obra A vida simples de um professor de aldeia, em Matinha tornou-se tradição a beligerante disputa entre dois grupos desde os primórdios do seu nascimento.

 Logo no segundo pleito, que guindou a prefeitura    Juca Amaral, a maior liderança desses homens lutadores, a unanimidade entre os próceres da libertação do município, que ocasionara a eleição de Aniceto Mariano, desvanecera-se.

   Havia já  o enfrentamento de um grupo opositor, sob a regência  de Francisco das Chagas Araújo, o dr Araújo, um dentista piauiense que chegara a Matinha, escolhendo nossa terra como  sua, angariando muitas amizades e apoios, inaugurando  assim, uma cizânia   política acirrada  e constante, que durante quase  setenta anos, alternou  a ocupação   do paço municipal, com o grupo Silva Costa.

Minha família, igual a todas as outras, tinha o seu lado, com são chamados os núcleos políticos. O nosso era, até por afinidades consanguíneas, os Silva Costa.  Cresci chamando aos ex prefeitos Aniceto e Juca Amaral de tios.

A residência onde morávamos, a  casa de vovó Lola, no cruzamento entre a rua Cel Antonio Augusto e a  Dr Afonso Matos, era muito visitada pelos parentes e amigos durante todo o ano, pois Tchem, Ana Rita Amaral da Silva, a quem chamo de mãe adotiva, além de enfermeira, parteira, também fazia política. Chegou a ser três vezes vereadora.

A recordação mais antiga que conservo, remonta a 1969, quando da primeira eleição de Raimundo Silva Costa – o Pixuta -, filho de Aniceto Mariano, prefeito de Matinha. Ficou gravado na inocência dos incompletos oito anos de idade, um chapéu de palha, que meu primo tinha na cabeça, neste estava escrito o nome Pichuta, com “ch”.

Palavras como subversão, ditadura, Cuba, comunista, AI 5, atos institucionais, revolução, exilio, aliança para o progresso, militares, transamazônica, etc…povoaram meu universo de criança, nas vozes de Tchem, mamãe, Juarez Costa, quando ia visitá-los; de  Valdivino  e Manoel Silva, que eu apreendia   embevecido, um pouco escondido, pois nos era proibido ouvir conversas dos “mais velhos”.

 Entravam em minha mente como flashes, porém sem nenhuma concatenação ou sentido.

Rememoro especialmente a narrativa   captada várias vezes da boca de mamãe, sobre uma moça filha de matinhenses, que fugira do Brasil por causa do governo, e que se encontrava com a mãe escondido. E aí comentava das perucas, dos disfarces e codinomes que utilizava.  Anos mais tarde vim saber quem era essa pessoa e os motivos que a levaram ao ato de fugir do seu país.

Do imbróglio de 72, quando Aristóteles Passos Araújo foi pela primeira vez eleito prefeito, mas não pode assumir, sendo substituído pela  vice Aldenora Borges;  depois  deposta, entrando o segundo colocado e opositor, José Estácio Baia Silva; encerrando o mandato Manoel de Jesus Amaral, presidente da Câmara Municipal; guardo poucas recordações.

Creio ter sido a partir  dessa época o apreço do povo matinhense por foguetes, já que bastava aventar a possibilidade de subida ao poder de um, fogos troavam; quando este assumia de verdade, mais barulho e fumaça; quando caia, rajadas do lado de lá; caia de novo, fogo pra cá.

 Estabeleceu-se como tradição na cidade: qualquer ação político partidária, a primeira coisa a fazer, comprar foguetes. Isto é tão levado a sério que temos durante as campanhas, em todas as agremiações, os “fogueteiros”, pessoas especialmente reservadas para praticar os atos. Virou uma profissão.

Rememoro desse tempo, além do barulho ensurdecedor dos foguetórios, a imagem da porta da prefeitura, cheia de fechaduras diferentes, pois a cada um que assumia, estas tinham que ser trocadas. E a contribuição pro vocabulário/anedotário de duas palavras, “rebordosa” e “revirote”. Tornou-se comum entre os moradores gritar: olha a rebordosa, a cada queda/ ascensão de titular no mandato.

Em 1976, as eleições levaram finalmente ao topo do poder municipal Aristóteles.  Decretando uma fragorosa vitória ao grupo rival.  Tchem minha mãe não biológica foi candidata a vice.

Acredito ter nascido nessa época uma fobia ao barulho de fogos. Quando findou a eleição, as urnas foram levadas até o município de Vitória do Mearim, para serem contadas, pois o pleito ainda era pelo sistema de cédulas, e o resultado demorava mais ou menos uns três dias para ser alcançado.

Nesse interim, Tchem viajou para São Luís, deixando a mim, com apenas 14 anos, papai e mamãe, na casa de vovó Lola. Ao sair o resultado, os adversários dando prosseguimento ao costume de comemorar com fogos, saíram em passeata nas ruas da cidade.

Desta feita uma nova modalidade inaugurava-se: foguetes sobre os telhados das residências que votaram contrariamente, especialmente aqueles que de uma forma ou outra sobressaíram-se, agiram mais fortemente na oposição. Tchem fora candidata a vice, estava, portanto, “relhada”, segundo palavra inventada por Benedito de Osvaldo, o BO.

 Em Matinha, o termo “voto secreto” é uma fábula, uma convenção. Qualquer um conhece o sufrágio de todos, e vice versa. Além do que   fazemos questão para isto vir à tona, ao colocarmos nos mais visíveis locais, a foto do candidato ou candidata preferido.

Parafraseando Chico Buarque, na canção Geni e o Zepellin, “nessa noite lancinante”, fomos açoitados por dezenas de projéteis, que subiam e desciam sobre a antiga casa. Lá dentro, embolados num único quarto, dominados pelo terror de um provável incêndio, víamos e ouvíamos tudo (a noite virara dia), torcendo para que acabasse logo aquele pesadelo, e pudéssemos dormir.

Pela primeira vez um gestor teria seis anos de mandato, ao invés dos anteriores que eram quatro. Entrei nele adolescente,  sai adulto.

Havia na cidade, desde a administração de Zé Estácio, uma biblioteca, acredito que financiada pelo governo federal, que disponibilizava um bom número de livros aos interessados. Ari manteve e melhorou os acessos das pessoas a esta.

 Passava boa parte do meu tempo ali, em concomitância com  a leitura dos bolsilivros de faroeste e espionagem, as revistinhas  de quadrinho trocadas e disputadas  em leituras quase conjuntas com  Cecé, Nonato de dona de Nhadica e um conterrâneo chamado João de Margarida,( nunca mais ouvir falar dele), iniciei-me no desvendamento de autores  clássicos e teor mais consistente.

Podíamos ler no próprio recinto, ou levar um número limitado de exemplares por pessoa para casa. Eu fazia as duas coisas. O professor Nonato Costa e Maria da Paz Teixeira, foram responsáveis pela biblioteca, se a memória não me falha.

Em 1978, fiz a primeira tentativa de residir em São Luís. Fui estudar no Liceu Maranhense. Para entrar nessa conceituada escola, necessitava exame de admissão, a aprovação veio numa avaliação de redação, cujo tema eram gatos.

Três meses depois estava de volta, não aguentara viver em pensionato. Longe da família, a saudade era imensa, pegara uma gripe, ficara muito fraco. Maria de Lola, uma mãe galinha, resolveu buscar-me. Tive sorte em não perder o ano, terminei o período letivo na Escola Etelvina Gomes Pinheiro.

O ano de 1979 foi marcante, na presidência o general João Baptista Figueiredo. O regime militar, ditadura que se iniciara em 1964, após a deposição de João Goulart, vivia seus estertores. O país estava convulsionado.

Pressionado por vários flancos, o general Figueiredo, que dizia gostar mais de cavalos que de gente, e  se ganhasse um salário mínimo, daria um tiro na cabeça, tentava através do seu chefe da casa civil, o general Golbery do Couto e Silva, (um estrategista formidável), a chamada transição pacifica, com a retomada do poder pelos civis, após os fracassos dos últimos anos com governantes militares.

Eu voltara a São Luís, desta vez para morar com meus primos, no bairro de Santa Cruz, não demorando muito, mudamos para o recém inaugurado conjunto Angelim. Consegui retornar ao Liceu Maranhense no segundo ano, cursando Técnico em Contabilidade. Na capital, com muito mais informações, (vivia na biblioteca do Liceu), novos amigos, abri minha mente para um outro mundo.

Participei do grupo Laborarte, naquele belo casarão da rua Jansen Muller, tive o privilégio de conhecer Nelson Brito e Tácito Borralho. Frequentei encontros onde o medo e a desconfiança em ser descobertos ou delatados era constante.

 Estive em reuniões com militantes de esquerda, alguns já trazendo sob os braços a criação de novos partido, acabara o bipartidarismo. A lei de anistia trouxera de volta muitos irmãos nossos que a ditadura exilara, esse fato nos animava para a peleja que se avizinhava.

 Começava a raciocinar, não mais amadoristicamente, mas  de modo metódico e estudado, não sem viver um  conflito fortemente religioso, pois os líderes espirituais, e a comunidade em geral, ao qual tinha acesso,  em sua imensa maioria, não sei se por ignorância, ou falta de caráter, abominavam, (como ainda hoje), a ideologia  marxista, a meu ver muito próxima do Cristianismo. A proposito dessa fase cartesiana, só consegui ultrapassá-la como certeza, muitos, muitos anos depois.

 Talvez o batismo de fogo da minha atuação política, que colocou na prática a famosa frase de Ernesto Tchê Guevara, “ Ser jovem e não ser revolucionário é uma contradição genética”, deu-se em agosto de 1979, quando em sublevação, São Luís, fazendo jus ao  epiteto de “Ilha Rebelde”, sob o comando dos estudantes, durante quatro dias deixou em polvorosa  Mauro Fecury (prefeito da capital), e João Castelo, o João Flagelo(governador do Estado), obrigando-os a conceder a meia passagem aos estudantes para  ônibus que circulavam no perímetro urbano.

Este acontecimento demarcou minha existência. Houve o João Carlos de antes, e o João Carlos de depois da greve estudantil. Entrei de um jeito no movimento, sai de outro, mais calejado, mais seguro quanto a crenças e conceitos ideológicos.

Personalidades como Domingos Dutra, Haroldo Saboia, Juarez Medeiros, dentre outros, e todos aqueles estudantes ávidos por mudança, me ensinaram aquilo que chamam práxis, a junção da prática a teoria.

O momento mais tenso da greve, quando o governador biônico,(a ditadura proibira  a eleição de governadores e prefeitos das capitais, desde de 1965), que estava fora do Estado, solicitou uma reunião com os estudantes nas dependências do estádio Nhozinho Santos, para dar satisfações e, segundo pensávamos, aceitar as  reivindicações.

Mais ou menos umas vinte horas, as dependências   lotadas, os ônibus fluindo quase normalmente, os portões foram bruscamente trancados, um helicóptero faz sobrevoo, dizem que com o governador dentro. Logo depois, dezenas de bombas de gás lacrimogênio são arremessadas contra as arquibancadas, todas oriundas das mãos dos policiais, que ali estavam num elevado número.

Ficamos encurralados, cegos, engasgados e presos naquele recinto fechado. A única solução foi a turba, num efeito manada, ir pra cima dos portões e arrebentá-los. Tudo isto debaixo de cassetetadas.

A partir daí a cidade voltou a parar. Os ônibus foram recolhidos as garagens, comércios fecharam as portas, a violência, truculência policial tomou espaço. Eu e Sebastião meu primo, a época cursando direito, tivemos que voltar a pé da Vila Passos para o conjunto Angelim. Nesse nosso retorno, observamos muitos atos de insanidade. Fiquei com sequela desse período:  uma resistente conjuntivite, em função das muitas bombas de gás lacrimogênio que a vista absorveu.

O país respirava novos ares, até na Igreja Presbiteriana Independente, reduto como aliás da maioria das igrejas, conservador, chegava. Lembro de moços que estavam na igreja, e foram molestados pelo status quo, por terem posturas progressistas. Nunca vou esquecer a pregação de um jovem da Primeira IPIB, guardei seu nome, Marcus Gilson, cujo tema era as opções do verdadeiro cristão: seguir Castelo e a ditadura ou render – se aos novos tempos democráticos.

Retorno a terra das mangas após a conclusão do curso de técnico em contabilidade, e da tentativa frustrada em passar no vestibular pra jornalismo.  Encontro uma pessoa, um companheiro, que congregava dos mesmos pensamentos e princípios, a quem tributei, junto com   outros companheiros, carinho, respeito, admiração, sentimentos de empatia, o dr Messias Costa Neto.

Passávamos muito tempo conversando, dividindo utopias, ouvindo Chico Buarque, paixão forte e recíproca, na calçada da casa de dona Terezita, onde se hospedava.

 Nos encontramos muitas outras vezes, no sindicato, reuniões do PT, agência do BEM. Messias possuía inúmeros predicados positivos, os que mais admirava eram o benevolente coração e a firmeza ideológica.

Nas eleições municipais de 1982, ocorre meu primeiro voto, estava então com vinte anos. A idade mínima para se tornar eleitor era 18.   Até tinha tirado o título, mas o utilizei dois anos depois, pois não ocorreu pleito em 1980.

 Sagrou-se vencedor Pixuta, no seu segundo mandato. Convém lembrar que a reeleição para prefeito era proibida pela constituição vigente, só se tornando permitida a partir   da carta magna de 1988. Este mandato também foi de seis anos.

 Pela primeira vez, concorreram três candidatos, o paradigma das duas famílias, fora momentaneamente quebrado.  O jovem lavrador e militante da igreja católica, hoje professor, José Maria Gonçalves Silva, corajosamente colocara seu nome para avaliação popular. pelo PDT. partido que fora fundado por Leonel de Moura Brizola, na sua volta do exilio.

A lembrança mais forte que guardo, foi de um caminhãozinho três quartos, usado por Pixuta para transporte, chamado pelo povo, especialmente os adversários, de “ caminhão  meia dúzia”.

Em 1984, no auge do governo Sarney, inflação altíssima, os banqueiros como sempre lucrando   bastante, o banco Econômico, inaugurou uma agência em Matinha. Fiz uma prova e consegui ser aprovado, juntamente com José Raimundo Viégas e Elizabete dos Santos, minha querida amiga Betinha.

Após um pequeno estágio na agência da cidade de Presidente Juscelino, região do Munim, assumimos nossos cargos: eu caixa, Zé Raimundo na contabilidade, Betinha, abertura de contas. Nosso gerente chamava-se Almir Mendes do Lago, o gerente adjunto, Rossivam de Oliveira. Formávamos, modéstia à parte, um bom time.

Meu primeiro ato, após a posse: filiação ao SEEB-MA,- Sindicato dos Estabelecimentos Bancários do Estado do Maranhão. Era presidente dessa instituição, ao qual faço parte ainda hoje, o ex deputado pelo PDT Julião Amin.

Mencionarei agora a uma pessoa, que nos ajudou muito durante todo o tempo que o banco passou em Matinha, mais ou menos uns dois anos, e que infelizmente faleceu recentemente. Pedro Morais Pinheiro, um cidadão formidável, nos apadrinhou de modo tão completo, que a filial da cidade, era considerada a menina dos olhos do Banco.

Pedrinho, carinhosamente chamado por nós, ou Moraes, como o denominavam no trabalho, exercia a honrosa e disputada função de tesoureiro geral na agência central do Econômico em São Luís.

  Nos enchíamos de orgulho, quando chegávamos naquele imenso salão no princípio da rua Grande, e víamos esse conterrâneo tão bem avaliado, paparicado, e respeitado por funcionários e clientes.

Havia um boom de inflação, os bancos trabalhavam maciçamente em   aplicações financeiras. CDB, RDB, LCI, LCA,. over nigth e open marketing etc..eram os investimentos existentes.

 Muita gente vendeu gado, terrenos, para entrar no mercado. Uma inflação altíssima permitia que as aplicações fossem diárias. Fazíamos muito Over Nigth, aplicava-se num dia, no outro já havia rendimento.

Em 1986 com o plano Cruzado I, desmoronou-se temporariamente esse processo inflacionário, e o Econômico decidiu fechar todas as agências abertas em cidades pequenas. Esta instituição financeira acabou sendo extinta em 1994, após o Plano Real.

Desempregado, procurei outros rumos. Ainda no ano de 86 fui trabalhar na construtora Odebrecht, que na ocasião    construía a Ma 014. Cheguei a morar em Viana, devido a dificuldade em voltar todo dia pra Matinha.

Em janeiro de 88, mudei-me pra Arari, fui trabalhar na COMABA – Companhia Maranhense de Abastecimento -, como classificador de cereais (arroz, milho, feijão e soja).  Fiz o curso no Ministério da Agricultura, que fora conseguido através de Antonio Augusto Silva Costa, o Antoninho Costa, que trabalhava lá.

 Era a segunda vez. Juntamente com Rogério de Luís Carlos, havia trabalhado como auxiliar de classificador em 1982, durante uns quatro meses na cidade de Balsas, ocasião em que esta cidade do sul do Maranhão, estava solidificando a ocupação do seu território por produtores sulistas, especialmente gaúchos. Também com a ajuda de Antoninho.

Arari e Vitória do Mearim, estavam iniciando a plantação de arroz em suas áreas alagadas, no processo de irrigação, com a chegada também dos gaúchos. A CIBRAZEM inclusive já tinha em Vitória um armazém instalado. Esse arroz para ser vendido, precisaria de um certificado de classificação, aí entrava a COMABA.

Instalado numa sala cedida pela COAA, (Cooperativa Agrícola Arari e Anajatuba) iniciei minha epopeia na terra das melancias. Fiquei nesse serviço um ano e meio, até que aprovado num concurso lançado pelo governador Epitácio Cafeteira(23º colocado), fui para o BEM – Banco do Estado do Maranhão-.

 Lotado na própria agência de Arari, chamada “caixa de isopor”, pela população, tomei posse como escriturário 1A no dia 10 de julho de 1989, exercendo a função de caixa. O destino me permitira pela segunda vez ser bancário.

 Uma nova filiação ao SEEB-Ma seria logo feita. Exercia a presidência da nossa entidade sindical, Petrônio Alves Macedo, mas um grupo opositor e da esquerda já estava sendo gestado em oposição, o MOB-CUT- Movimento de Oposição Bancária, ligado a CUT, – Central Única dos Trabalhadores. Logicamente, eu estava dentro.

Durante estada em Arari, casei-me, e fiz muitas amizades.  Cidade dotada de um povo extremamente hospitaleiro e agradável, na terra das melancias constitui muitos laços fraternos, que foram além da família de Antonia, os quais ainda hoje perduram.

Pra não perder o costume, fiz política. Quando ainda estava na COMABA, juntamente com Clemilton Oliveira Alves, que representava a OCEMA, entidade que congregava as cooperativas no Estado, prestando serviços de assessoria no municípios de Arari e Anajatuba, para a COOAA, participamos de diversas reuniões e eventos do grupo de oposição liderado por Zé Luís Fernandes, ligado ao PSB.

Clemilton é aquele companheiro que tem o ativismo de esquerda no sangue. Nos identificamos bastante no que tange a conceitos ideológicos e de vida, por causa disso nutrimos um pelo outro muito carinho e respeito. Nós que chegamos a dividir uma casa em Arari, passamos 25 sem nos vermos, embora militando no mesmo espaço político, e tendo inúmeros amigos comuns. Hoje, os dois morando em São Luís, continuamos no mesmo nível de amizade. A chama na busca da concretização dos sonhos e ideais que tínhamos na juventude, permanece inalterada.

O ano de 1988 foi de eleições municipais, em Arari vence Horácio da Graça Sousa, em Matinha Raimundo Freire Cutrim.

 Oriundo do povoado Olinda dos Castros, Raimundo Cutrim fora eleito como vice na gestão de Aristóteles no período 1977 – 1982. Rompido após o mandato, agora se elege no grupo Silva Costa.  Nessa eleição a dicotomia também foi quebrada, Gaudencio Silva Bastos, o Goda, representando a família Amaral, saiu candidato.

Lembrança marcante dessa eleição: durante a apuração, que era ainda por cédula, contada e cantada, uma a uma, Raimundo Cutrim, estava perdendo. Quando entraram as urnas do então povoado Olinda, a situação se reverteu, dando a vitória no computo geral a ele. Seu torrão natal lhe dera mais de 90% da votação.

 Seu Raimundo ainda se tornou a primeiro prefeito da cidade de Olinda Nova, após sua emancipação, nas eleições de 1996.

  Em 1989, o país estava pulsante: era o último ano do mandato esticado de José Sarney, desgastadíssimo e enfrentando mobilizações intensas contra sua gestão.

 Teríamos finalmente, após centenas de manifestações, debates, uma assembleia nacional constituinte, que dera ao país nova carta magna; substituindo uma constituição elaborada na ditadura, movimentos pelas diretas já, etc.., a primeira eleição direta para presidente da República.

Passaram-se 27 anos desde a eleição de Jânio Quadros, uma geração inteira fora podada do privilégio que qualquer povo se orgulha, a capacidade de eleger o seu presidente.

Era uma festa de cores e bandeiras diferentes, o pluripartidarismo estava implantado, e todos foram representados. Citarei alguns dos mais importantes candidatos e partidos. Mario Covas (PSDB), Ulisses Guimarães (PMDB), Enéas Carneiro (PRONA), Luís Inácio Lula da Silva (PT), Leonel de Moura Brizola (PDT), Fernando Collor de Mello (PRN).

A nova Constituição Federal, havia instituído o sistema de dois turnos nas eleições presidenciais, ou seja, se nenhum partido ou coligação conseguisse atingir o percentual de 50% + 1, no primeiro escrutínio, far-se-ia uma nova eleição com os dois primeiros colocados.

  A democracia transpirava por todos os poros, passeatas, comícios, debates televisivos entre candidatos e na imprensa, mobilizavam e movimentavam a nação do Oiapoque ao Chuí. Jingles de candidatos viraram hits na boca da população.

Em 15 de novembro ocorreu o primeiro turno. Três candidatos lideravam as pesquisas, Collor, Brizola e Lula.  Antonia e eu votamos e fizemos campanha para o ex governador do Rio de Janeiro.

 Ao final das apurações, o ex governador de Alagoas saiu vencedor, e o ex metalúrgico e ex deputado fica em segundo, derrotando por pequena margem, aquele que todas as pesquisas davam como o candidato que disputaria o segundo turno, Brizola.

Em 17 de dezembro ocorreu o embate do segundo turno, numa disputa voto a voto, Fernando Collor consagra-se o primeiro presidente escolhido diretamente pela população, após longo período ditatorial.

Eleito com um discurso moralizador, contra a corrupção, os” marajás” do serviço público, as maracutaias do governo que o antecedeu, dizendo-se livre das amarras da “velha política”, (soa familiar?), Collor de Melo, parece querer, numa hermenêutica bem atual, contemporânea, confirmar a famosa frase, quase profecia do filósofo comunista  Karl  Marx, no seu livro Dezoito  Brumário de Luís Bonaparte, de 1852  : “ A história se repete, a primeira vez como tragédia, e a segunda como farsa”.

A década de 90 prometia muita emoção,  a queda do muro de Berlim, uma parede de pedras e arame farpado que separava  as duas Alemanhas, era o símbolo palpável da derrocada do  Socialismo Real, consequentemente implodindo a URSS, União das Republicas Socialistas Soviéticas, dando a momentânea sensação da quebra do mundo bipolar,  que tinha no evento histórico   Guerra Fria, sua maior expressão.

Esses e outros acontecimentos foram tão importantes, que até levaram o filósofo, cientista político e economista norte americano Francis Fukuiama, a escrever um artigo até hoje intensamente debatido nas hostes acadêmicas cujo título é “O fim da História”.

Presidia os Estados Unidos Ronald Reagan, um ex ator de Hollywood, do partido Republicano; a URSS estava sob o domínio do líder Mikhail Gorbatchov.  No Brasil, Fernando Collor; no Maranhão, Epitácio Cafeteira, em Matinha Raimundo Cutrim.

Em 1990, quando ainda trabalhava na agência de Arari, recebi o telefonema de um conterrâneo a quem prezo enormemente, José Ribamar Aroucha Filho, que os amigos mais próximos chamam de Arouchinha.

Arouchinha tinha uma proposta ousada e inovadora: a constituição de um grupo que pudesse efetivamente fazer frente aos dois que se alternavam no poder da cidade desde sempre. Pela primeira vez falou-se claramente em terceira via.

Dotado de excepcional capacidade de articulação e convencimento, Arouchinha começou a agregar moradores em Matinha, e São Luís, das mais diversas atividades e gerações, que compartilhavam do mesmo ideal.

 Fazíamos reuniões, elaborávamos propostas, sonhávamos muito. O movimento se encorpava e, logicamente incomodava. As pressões apareceram dos mais variados setores, especialmente nossos familiares.

As motivações estavam na boca de pessoas por nós amadas, respeitadas, tios, tias, primos, etc.. parentes cuja proximidade não poderiam ser relativizadas. “vocês sabem o que vai acontecer, né”, perguntavam com insistência e temor.

Após muitas reuniões, discussões, negociações, concessões, resolveu-se, não sem algumas defecções, apoiar ao candidato natural e mais forte do grupo Silva Costa, Pixuta

Embora não alcançando uma candidatura, acredito termos conseguido alguns avanços nos nossos propósitos.

Realizamos    pela primeira um seminário, onde foram debatidos os principais problemas do município, nas áreas de saúde, educação, meio ambiente, etc.. Desse simpósio resultou uma cartilha com propostas encampadas pelo candidato. Ficou também o compromisso de que membros nossos fariam parte de um eventual governo, em caso de vitória.

Seria uma batalha épica. Pela primeira vez as duas maiores representações dos lados políticos, ambos filhos de ex prefeitos, ex vereadores, ambos já tendo experimentado o privilégio governar nossa terra, um por duas vezes, o outro, uma vez, mas eleito duas, fariam um confronto tete a tete.

A população esperava ansiosa, expectante, a batalha dos dois gigantes, que embora professassem e praticassem estilos diferentes, eram igualmente queridos.

Tive um envolvimento pleno nessa campanha, participei do grupo de jovens que mapeara a cidade e caminhou povoado por povoado, reunião por reunião, levando o plano de governo e debatendo-o com os moradores.

Quero aqui fazer uma homenagem a três pessoas que creio foram essenciais nessa jornada, simbolizando heroicamente o espírito da juventude e do ideal   que nos norteava e impulsionava, as hoje professoras Cristiane Costa da Silva, Maria Madalena Nascimento Pereira, e a médica veterinária Tania Maria Duarte Silva.  Houve muito mais jovens participando, essas companheiras apenas os estão com brilhantismo, representando.

Terminada a eleição, Pixuta obtém o seu terceiro mandato. A meu juízo foi a primeira vez que uma parcela grande da juventude se mostrou mobilizada para uma campanha política, nos moldes da que realizamos.

 O sentimento da vitória perpassava por nossas almas. Havíamos concretamente contribuído para que ela acontecesse, e ficamos bastante orgulhosos, peito estufado, quando o próprio candidato eleito, dedicou aos jovens seu retorno a prefeitura.

Devo ainda mencionar, não só por registro histórico, mas como um ato de justiça, a participação do dr Pedro Carlos dos Santos e da professora Maria Vitória França Nunes, atores fundamentais para o desfecho positivo desse episódio que tanto nos orgulha em ter participado.

O cenário no país mostrava-se caótico. O impeachment de Collor de Mello era a ordem do dia, massas de estudantes, especialmente secundaristas, foram pra rua exigindo a saída do presidente, no movimento chamado de “caras pintadas”. Passado o impedimento, assume o vice Itamar Franco, num governo de quase plena coalizão, onde até as oposições, que não compuseram com o novo governo, não partiram para a altercação mais crua.

Já membro do SEEB, comecei a participar das lutas da categoria. Fora transferido para a agência Matinha, recém inaugurada.  Estava na composição da chapa que concorria a direção do Sindicato, na função de diretor da regional Pinheiro.

Na vida pessoal, eu e Antonia, casados desde 89, sentíamos a necessidade de ter um filho. Fizéramos inúmeros exames e nada desse filho ou filha aparecer. Em 92, adotamos Guilherme, nascido em 12 de outubro, dia das crianças, data do desparecimento de Ulisses Guimarães e Severo Gomes. Pouco depois, passada a ansiedade, nasceram Ana Flavia e Gustavo.

 Meu tempo era tomado pelo banco, a igreja, e a política local e sindical. Viajava mensalmente para reuniões. A nível local, envolvia – me com os companheiros do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, STTR- Matinha. Em 1994 Antonia e eu nos filiamos ao PT.

 A movimentação era enorme no STTR, foi um tempo de intensidade e paixão nas refregas. Companheiros(as) como Edmilson Morais, Raimunda Barros, João Teixeira Meireles – João Vitor -, já falecidos, Maria de Lourdes Gonçalves, José Maria Gonçalves, Boaventura Morais, dentre outros, foram e são a prova viva de que lutar vale a pena. Me emociona relembrar esse tempo.

Sob o comando desses companheiros(as), a lide  sindical tomou proporções  grandiosas, muitos dos políticos de centro esquerda que hoje estão em evidencia, tiveram oportunidade de conversar com a população no nosso -digo nosso na certeza de que ali era também o meu, embora sendo de outro sindicato-  espaço, uma vez que junto aos dois lados tradicionais, não conseguiriam.

Domingos Dutra, Juarez Medeiros, Conceição Andrade, Luís Vilanova, Léo Costa, José Luís Bernal, Bira do Pindaré, dentre vários, estiveram conosco, estimulando e vivenciando batalhas por um mundo melhor e mais justo.

A criação rádio Manga FM aconteceu por causa da perseverança e afinco da diretoria do sindicato, bem como da capacidade de articulação e diálogo de Boaventura, com entidades e moradores do município. Um tempo de conquistas, alegrias e temores. Inolvidável    o episódio da invasão da rádio pela Polícia Federal, quando Zé Maria era presidente e eu tesoureiro.

A eleição presidencial de 1994, elegeu no primeiro turno o senador por São Paulo, do PSDB, Fernando Henrique Cardoso, o FHC. Escolhido como ministro da economia do governo Itamar, FHC colheu os louros do plano real, implantado com o objetivo de conter a hiperinflação e estabilizar os preços dos produtos.

Nesse ano ainda conquistamos algo fundamental para nós, a nossa residência própria. Desde que chegáramos em Matinha, morávamos de aluguel. Em 94 foi possível dispensar esse gasto.

Minha entrada no sindicato dos bancários, deveu-se aos companheiros Uílio Oliveira, a época presidente do SEEB; Elves de Sena Ferreira, irmão na fé, bancário do Unibanco, membro da Diretoria Executiva, e João Francisco Martins Souza, então diretor da regional Pinheiro.

  Logicamente possuía no coração o espírito da resistência, mas eles insistentemente, persuadiram-me a participar institucionalmente. Foram dezenas de ligações, naqueles tempos de telefone ruim, mostrando o quanto seria importante minha adesão ao processo eleitoral e na composição da chapa.

Ainda alimentava nos poucos anos de banco, a ilusão, que acredito perpassa pela cabeça de todo trabalhador, de evoluir na carreira e chegar até um cargo melhor e mais bem remunerado. A chamada ascensão profissional.

 Coube a eles, a santificada missão de colocar o pingo nos is, mostrando-me a realidade de que ao optar pelo espaço sindical, estava inexoravelmente rompendo com essa possibilidade.

Outra pessoa que me acudiu foi um amigo, padrinho de casamento, irmão, companheiro, a quem sempre recorro   ao tomar decisões, e já se vão mais ou menos uns quarenta anos, Zwingle Pinheiro Braga. Zwingle, como sempre acontece, foi bastante importunado, na consulta do que seria, no fim das contas, o meu futuro.

Foram sem dúvida alguma anos áureos, fabulosos, de inimaginável conhecimento. No Sindicato incorporei experiências que jamais seriam possíveis em quaisquer faculdades, e principalmente conheci a verdadeira face, e o orgulho de defender uma categoria das mais importantes na história do Brasil.

Ficou marcado com sangue, a renhida luta que efetuamos contra o presidente do Banco do Estado e a governadora do Maranhão, quando esta resolveu, para agradar o mercado e o neoliberalismo, privatizar esta cinquentenária instituição.

 O ato insano concretizou-se, mas nós não fomos derrotados, saímos do fragor da batalha de cabeça erguida, e plenamente conscientes de que estávamos do lado certo da história.  Combatêramos o bom combate.

Os cursos, as viagens, as manifestações, os embates, as querelas, as reuniões, as negociações, as greves, moldaram o ser humano que sou. Através do Sindicato dos Bancários, oportunizei incontáveis facetas daquilo que chamamos vivência e convivência. A esta categoria, que hoje aposentado faço questão de pertencer, minha eterna gratidão.

Em 1995 aconteceu o plebiscito visando a emancipação da cidade de Olinda Nova. Foram disponibilizadas três secções no povoado de Olinda dos Castros, para a efetivação do evento.  Tive o ´privilégio de presidir uma dessas secções, as outras duas estavam sob o comando de Jerry Jackson Furtado Gomes e Carlos Alberto Ferreira da Silva, meu amigo Cabeco.

Nas eleições de 1996, Aristóteles Araújo retorna ao poder municipal, no seu segundo mandato. Nesse pleito a dicotomia também foi quebrada, o PT lançou a candidatura do sindicalista rural Boaventura Moraes, como terceira opção.

Em 1997, cumprindo ao nefasto plano de sucateamento, com a desculpa fajuta, de contenção de gastos, senhor que estava na presidência do BEM, resolveu fazer a minha demissão.  Erámos quatro funcionários na agência, e só ficariam dois, um foi transferido e o outro, no caso eu, demitido.

Houve intensa comoção na cidade, fizeram abaixo – assinado com muitas páginas, pedindo a diretoria, a deputados, a revisão, a anulação do ato, tudo em vão.

Vivemos quatro meses de   dor, expectativas e incertezas quanto ao futuro, não tanto por mim, mas pelos três filhos pequenos e esposa que estavam comigo. Pra tornar ambiente mais nebuloso, a demissão de acordo com a legislação, foi ilegal.

Acontece que estava inscrito numa das duas   chapas concorrentes a direção do SEEB, e isto me dava, segundo normas da CLT, a chamada estabilidade sindical provisória, que preconiza 1 ano de manutenção do cargo, ao dirigente postulante, a partir do registro das candidaturas.

A eleição acontecera, e perdemos, mesmo assim, ainda tinha a garantia da estabilidade. Isso na prática não ajudava, e a tensão se tornava insuportável.

Resolvi então procurar o banco, para tentar um acordo e desbloquear ao menos o FGTS. Nesse interim, impetramos   recurso contra a chapa vitoriosa.  A reversão aconteceu. Seria o mandato do atual deputado federal Bira do Pindaré na presidência do sindicato.

Recordar o momento em nos reunimos perante o representante do ministério do trabalho, eu e o preposto do instituição bancária, um colega que não conseguia me encarar fixamente,  ficando só de cabeça baixa, é ao mesmo tempo alegre e triste.

Quando o funcionário do MT perguntou se estava de acordo com a demissão, ao receber de mim resposta negativa, e virando o rosto para o colega representante do banco, não encontrando guarida no que perguntara, senti que algo acima do natural, estava acontecendo.

Conclusão:  a homologação não aconteceu, e aconselhado pelo próprio representante do ministério, entrei na justiça em Matinha, reivindicando a reintegração, o que ocorreu tempos depois, de forma liminar. Voltei então a função de caixa na agência.

Algumas lições foram retiradas dessa sinistra ocorrência: pelo imenso de número  assinaturas conseguidas para que eu permanecesse, aprendi que uma parte considerável dos meus conterrâneos gostavam de mim; ficou uma interrogação sobre os critérios adotados para a  demissão, por que a mim?, Essa dispensa seria efetivada se eu pensasse dentro da caixinha do BEM e não fosse sindicalista, militante contra a privatização? Qual o grau de comprometimento de gestores e políticos nesse ato? Nunca obtive uma resposta convincente.

Mas a lição mais importante, devo dizer, foi a certeza do imponderável, quando todos os prognósticos concluíam para o negativo, todas as tratativas com políticos, autoridades, se mostravam inócuas, eis que o milagre ocorreu.

 Como cristão, creio firmemente que Deus é condutor da vida e da história, sua onisciência, onipresença e onipotência permitem, numa visão calvinista (que sigo), predestinar e eleger. Naqueles momentos de angústia e incertezas, minha Fé se agigantou e sentia perfeitamente que Ele me conduzia.

Fernando Henrique Cardoso, foi reconduzido a presidência do país nas eleições de 1998, no primeiro turno, e se torna o até então único presidente reeleito na nossa história. Mais uma vez seu principal adversário foi o partido dos trabalhadores, na pessoa de Lula.

Estava acontecendo comigo uma verdadeira roda viva:   dividia o tempo entre a igreja, política sindical, o SEEB, as reuniões do partido, o trabalho extenuante no banco, e ainda arranjava espaço pra pescar de anzol nos igarapés e bamburrais.

Resultado de todo esse estresse, comecei a ter sintomas de LER/DORT. Um caixa, chegava a efetuar mais de 800 autenticações, num ambiente inadequado, com condições insalubres, de ergonometria péssima.

Em 1999, fui afastado pela primeira vez, o conselho médico de trabalho do BEM, com base em exames, solicitou meu afastamento, e como desgraça pouca é bobagem, este fato foi concomitante ao atropelamento de Ana Flavia, então com cinco anos, que a deixou vários dias  em coma.

O ano dois mil chegou, e com ele, muitas movimentações, esperanças, e projeções apocalípticas. Nas eleições municipais, mais uma vez os munícipes veriam a disputa entre as grandes lideranças dos dois clãs adversários.

A constituição de 1988, permitiu a reeleição. Aristóteles, no exercício do cargo, colocou o nome para disputa; no grupo Silva Costa, Pixuta também postulava a função.

O PT que tivera candidato próprio no pleito anterior, havia se dividido, e a maior parte dele, apoiava ao detentor do cargo. Nesse segundo enfrentamento direto, a vitória sorriu para Aristóteles, que ao final do litígio, tornou -se pela terceira vez, ocupante do paço municipal.

Um curioso placar    mostrava-se nas disputas dos maiores representantes da política matinhense: empate. Em número de mandatos, três; confrontos diretos, um pra cada.

Em 2002, finalmente, após três eleições disputadas e perdidas, o metalúrgico Lula, chega a presidência do Brasil. Foi uma campanha memorável, e nós do partido em Matinha, estivemos nela envolvidos, na ardente defesa de sua vitória. João Vitor, De Lourdes, Zé Maria, Jorrimar Gomes Ferreira, Rosa e João Carlos, dentre outros companheiros, fomos pra luta, povoado por povoado, rua por rua, levando sua mensagem.

Em 2004, o grupo Araújo perde as eleições, sagra-se vencedor Marcos Robert Silva Costa, o Beto Pixuta, em seu primeiro mandato. Os Silva Costa retornam ao poder. Nessa eleição o jovem Valdemir Santos Amaral, também saiu candidato, pelo PSB.

Em 2006 Lula ganha o seu segundo mandato, reelegendo-se. Ele que governara para todos, e conseguiria o que nunca alguém das elites atingira, já via estas incomodadas com sua popularidade. Entrava em jogo a guerra hibrida, era o tempo do mensalão

 No Maranhão, a oligarquia que desde 1965, dominava o Estado, perdera o comando, foi eleito o dr Jackson Lago, um médico que fora três vezes prefeito da capital. Nessa eleição elege-se para a Câmara alta, o ex juiz federal, Flávio Dino, que fora advogado do Sindicato dos Bancários durante alguns anos.

Eleições municipais de 2008, o grupo Araújo dá o troco. Elege Emanoel Rodrigues Travassos, o doutor Emano, cunhado de Aristóteles e médico no município.

Em 2009, a oligarquia consegue seu retorno ao poder, cassando o mandato do dr Jackson. Assume a segunda colocada, Roseana Sarney, faltando um ano para novo pleito.

O PT consegue em 2010, eleger a primeira presidenta do país, Dilma Vana Roussef. O ódio das elites, empresários, políticos, banqueiros parasitas da nação, e pobres de direita,  em conluio com o PIG (Partido da Imprensa Golpista), beneficiados diretamente pelo crescimento econômico, aumentaram os ataques contra os pobres, que pela primeira vez estavam comendo e vivendo melhor, e até viajando de avião. Desta vez incorporando além dos já conhecidos preconceitos, e injúrias, uma nova modalidade, a misoginia.

Matinha ano de 2012. Beto Pixuta aquinhoa seu segundo mandato, trocando mais uma vez as rédeas do município. O detentor do cargo resolvera não concorrer a reeleição. A disputa foi contra Eldo Jorge Everton Cunha, jovem professor que fora secretário de finanças na gestão findada.

Nesse ano mudei-me para São Luís, conseguira ser aprovado no Enem, iria cursar Filosofia na UFMA.

Em 2014, já atingida mortalmente pelas forças reacionárias, enlouquecidas pela crise de abstinência de três mandatos sucessivos fora do poder, e após um fiasco monumental da seleção de futebol, que fora humilhada numa copa do mundo dentro do Brasil, Dilma alcança seu segundo mandato.

2016 consolida a barbárie, a primeira presidenta eleita e reeleita sofreu um processo de impedimento altamente questionável no seu fundamento, num circo de horrores armado e televisionado para todo o mundo. Assume então o vice Michel Temer.

Em Matinha, mais uma vez a roda gira, o grupo Araújo retorna ao poder, elegendo pela primeira vez uma mulher, a professora Linielda Nunes Cunha, a Linielda de Eldo.

Em 2018, o povo brasileiro elege Jair Messias Bolsonaro.

Estamos no ano de 2020, a história segue seu curso, afinal, diferentemente ao que escrevera na década 90 o norte americano Fukuiama, ela não tem fim, a meu ver, no máximo, renova-se tal qual Fênix.

Os cenários estão postos, os personagens ativados, o jogo sendo jogado. Os episódios se sucedem. Nos EUA, o presidente Donald Trump, Republicano, parece perder terreno para Joe Biden, dos Democratas, tendo a pandemia do covid-19 como mais um elemento complicador.

No Brasil, o ex presidente Lula, preso por mais de 500 dias, continua sendo figura de proa. Seu algoz, deixou a magistratura, virou ministro do atual governo, e já saiu, mantém postura de candidato em 2022. O governador Flávio Dino, eleito em 2014 e reeleito em primeiro turno, tem boa aceitação, sendo sempre lembrado   para a eleição presidencial.

Em Matinha um fato inédito, histórico, parece está acontecendo: os dois grupos litigantes, que se revezaram no poder municipal desde antanho, agora sinalizam uma aliança, uma união, para enfrentar a prefeita nas eleições. A perspectiva é que teremos três candidaturas, pois o pecuarista Francisco Silva Júnior, o Júnior de Raquima, também está pondo seu nome para concorrer.

A história é um trem seguindo seu caminho em trilhos paralelos, até o infinito, não existe parada.  Como defensor do sistema   chamado Anarquismo, que é a instância máxima da minha ideologia utópica, ciente da   limitação em termos históricos, e dos estágios atingidos, entendo que não alcançarei esse tempo. Permaneço, no entanto, firme na defesa do que acredito.

Este texto certamente sofrerá continuidade. Se não for mim, será por outra pessoa, que tenha interesse em manter sua narrativa em evidência.

Para encerrar, parafraseio o maior  herói da esquerda no mundo, Ernesto Chê Guevara: HASTA LA VICTORIA, SIEMPRE

*João Carlos da Silva Costa Leite é cronista e escritor, natural de Matinha – MA. Bancário aposentado, casado, presbítero em disponibilidade da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB). Membro do Fórum em Defesa da Baixada Maranhense (FDBM). Membro fundador da Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras (AMCAL), ocupando a cadeira de número 17, cuja patronesse é sua mãe, Maria Jose da Silva Costa Leite. Graduando em Filosofia pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA).


4 respostas para “Artigo de João Carlos: Trajetória de Vida – Memorial III – Política”

  1. Uma verdadeira aula de história política da nação, dialogando com a vida do meu camarada João Carlos , estou agora mais orgulhoso de ter você como amigo João. Parabéns 👏👏👏👏👏👏👏✊✊✊✊

  2. Eu gostaria de dizer a esse senhor, que faz alusão ao dia 12 de Outubro,
    que não tem nada de mais importante nesse dia que:
    É o dia dedicado à Padroeiro do Brasil:
    Nossa Senhora Aparecida.
    E nada se iguala em importância nessa data, seja:
    ✓ Dia das crianças,
    ✓ Data do desparecimento de Ulisses Guimarães,
    ✓ Descobrimento das Américas.

  3. Parabéns João Carlos pelo memorial III, o mesmo contempla os dois primeiros esporte e religião de maneira suscita. Na política eu diria que é uma análise da política mundial passado pelo mundo bipolar até a sincronização de quem estava no poder da Europa a Matinha no mesmo período. O mais importante, na política Matinhense sem ferir um cidadão sequer. Obrigado pelo presente meu amigo.

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