Artigo de João Carlos: Pra não dizer que não falei de PETs…

Por João Carlos Leite – A domesticação de animais, segundo fontes consultadas, iniciou-se no período neolítico, quando algumas populações humanas deixaram de ser nômades, passando a ser sedentárias. Arqueólogos afirmam que dos animais irracionais, hoje a conviver pacificamente com seres humanos, o cão foi o iniciador do processo. Destarte, além de ser considerado o melhor amigo do homem, o cachorro também é o primeiro.

João Carlos Leite, membro da Academia Matinhense de Letras

No antigo Egito, vários destes ganharam status, passando de mera criação, a condição de sagrados: o boi, algumas aves, o cão, o gato. Elevar seres ditos irracionais, a situação acima do que representam na natureza, não é novidade. Na Índia, as vacas, o elefante, o macaco e a cobra, estão na estatura de divindade. Na Bíblia, antigo testamento, segundo o livro de Êxodo, o povo hebreu, num dos seus inúmeros distanciamentos da palavra verdadeira do Deus Javé, decidiu idolatrar um bezerro de ouro.

Jesus Cristo, herdeiro celeste, Salvador do mundo, Messias, é também chamado de Cordeiro de Deus. Na literatura, cinema, são vastos os exemplos de animais como personagens principais ou coadjuvantes especiais, tanto no mundo, quanto no Brasil. Portanto, essa onda que invade nossa sociedade, dos “Pets” – um anglicismo para animais de estimação -, não chega a ser novidade na história humana. Junta-se a isto, movimentos de veganismo e ativismo contra os que comem carne. Está então aberto o caminho da pós-modernidade.

A memória mais antiga que possuo no quesito animais de estimação, é de um cachorro, criado por dona Joana e seu Boaventura, de nome Kalar. Causava espanto, esse nome diferente. Segundo mamãe era em homenagem a um cão, personagem, salvo engano do livro As mil e uma noites, um clássico da literatura árabe, muito lido e comentado pelas gerações mais antigas. Ainda de acordo com Maria de Lola, na casa de seu Boaventura, existiram várias gerações de cães com essa denominação. A cada unidade morta, uma outra era escolhida, todas com o nome de Kalar. Creio que cheguei a conhecer duas.

Recordo ainda, de um cachorro chamado Casquinha, criado lá em casa, junto com os gatos de Tchem e vovó Lola. Este possuía duas características interessantes: a começar pelo nome, que na realidade era Carcará, porém em função desse ser o apelido de uma pessoa da comunidade, o qual ficava muito zangado em assim ser nomeado, resolveu-se alcunhá-lo de Casquinha. Também não fazia au, au. Seus ladridos eram parecidos com alguém tossindo. Isto acontecia, em função de certo dia, numa caçada, ter mordido um porco espinho. Consequentemente, muitos acúleos localizaram -se em sua boca. Foram retirados a maioria, mas provavelmente, devem ter ficado um ou dois encravados na garganta, o que ocasionava aquela estranha forma de latir.

Quando estávamos sentados na calçada, ou de madrugada, no silêncio da noite, e ouvíamos esse bizarro pigarro, já sabíamos, era ele. Extremamente afável, Casquinha vivia se enroscando no meio de nossas pernas, quando em noites de lua, ficávamos conversando sobre histórias de assombração, contando anedotas, nos bancos de cimento do comércio de seu Miguel Brito, de tio Ademar, na calçada alta do casarão de Juca Amaral, ou na entrada da casa de vovó Lola. Inconfundível com seu uivado exclusivo, Casquinha era bastante querido pela garotada da rua. Ao morrer, deixou muita gente triste. Eu inclusive, cheguei a chorar.

Tempos depois Ana Rita (Tchem), começou a criar uma bela cadela chamada Chelala, nome dado em alusão a uma casa bem famosa, que vendia creio, material de construções em São Luis. A propaganda dessa loja chegava até nós através das ondas das rádios Difusora e Educadora. Logo depois, seu Miguel Brito, pai do meu amigo de infância Kebinha, iniciou a criação de um cachorro, ao qual denominou Smith, numa referência ao revólver Smith Wesson. Smith coitado, não durou muito tempo, faleceu ainda pequeno. Seu Miguel, ótimo contador de “causos”, resolveu criar um cordel, relatando as peripécias e desventuras desses três personagens que ficaram famosos naquele espaço da Rua Cel Antônio  Augusto, cruzamento com a Dr Afonso Matos. Centro de Matinha. Onde nascemos e crescemos.

Não lembro bem como eram todas as estrofes. Ficaram gravadas duas: “ Smith era bem pequeno/ pouca falta ele deixou/ não foi como Casquinha/ que até João Carlos chorou/ e continua Ana Rita chora muito/ mas depois ela se cala/ morreu Casquinha/ mas ficou minha Chelala”.
Naquele trecho havia, criados soltos e avulsos, cães e gatos, que como todos sabemos, não conseguem coexistir pacificamente, em quase todas as casas. Os conflitos eram então inevitáveis, incontroláveis, sanguinolentos. Ganidos, miados, mordidas, arranhões, sobravam para todo lado. Até para o nosso, quando tentávamos “ desapartar”.

Também fez parte da minha infância uma curica ou papagaio, a quem chamávamos de Rosa. Rosa dormia a noite num poleiro dentro da casa de vovó Lola, mas passava o dia entrando e saindo para o quintal, subindo nos galhos, comendo carambolas, goiabas, peruanas e gritando “ eh João Carlos, passa pra casa João Carlos”, reverberando provavelmente, o que ouvia de mamãe, vovó e Tchem, para aquele menino traquinas. Meus últimos contatos com pets, se deram quando já estava casado, morando em Matinha. Tentei criar um cachorrinho o qual denominei King. Esta já era a segunda tentativa com cães e com esse nome. Ambas foram infrutíferas, os dois faleceram pequenos.

Também cheguei a ter em casa alguns jabutis, primeiro ganhei uma fêmea chamada Vivi, depois vieram mais dois. Com medo de ser enquadrado pelo IBAMA, doei ao filho de um amigo militante, que se encantara com eles quando os viu. Esse amigo possuía um sitio. Os animais foram soltos por lá. Esses jabutis faziam a alegria dos colegas dos nossos filhos, quando crianças. Estas foram em suma, minhas experiencias com animais de estimação – pets -.No computo geral, tornaram-se não exitosas, parece que a gente não se dá bem. Nossos santos não batem, como diz o provérbio popular. Acho muito bacana as pessoas terem gatos, cachorros, ou quaisquer outros animais, criando-os como se fossem gente, para mim nunca deu certo. Os pelos, os cheiros, as fezes, etc, não me apetecem, incomodam, além de aumentarem enormemente a rinite que possuo, causando espirros, comichões, pruridos, dores de cabeça.

O mais interessante, é que eles, nas suas santas ingenuidades, próprias de uma índole amorosa e carinhosa, sempre denotam alegria quando chegam próximo a mim. Se soubessem da verdade, não seriam tão explícitos nessas manifestações.

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