Artigo de João Carlos: Matinha terra amada, vínculos indissolúveis…

O segundo semestre de 2012, marcou minha definitiva ida para São Luís, nessa ocasião ingressei no curso de filosofia da UFMA – Universidade Federal do Maranhão-. Deixei portanto, um mundo onde mantinha bom domínio, circulação e interação, me aventurando numa realidade naquele momento, completamente diferente, obscura e indefinida.

Vista área do município de Matinha

Fiz essa mudança com o coração e alma em frangalhos, no entanto os fatos, as ocorrências, as evidencias, os amigos mais próximos, o pediam ou exigiam, até mesmo para a preservação da minha saúde, que se deteriorava celeremente, em função de vários motivos, inclusive políticos, mas principalmente pela distância de Antônia e dos meninos, que já moravam na capital maranhense.

Nesses anos, parafraseio um ditado popular :deixei Matinha, Matinha não me deixou. Em seu poema confidencias do itabirano, o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, finaliza com uma frase famosa, “Itabira é apenas um retrato na parede, mas como dói”.  Igual Drummond, morando no Rio de Janeiro, distante da sua querida Itabira, assim me conservo, longe da minha amada Matinha; contudo diferentemente do bardo mineiro, que devido à distância, imensa naqueles tempos sem tecnologia, resumiu seu amor a um retrato na parede, pra mim, a terra da manga ocupa holisticamente todos os espaços possíveis e imagináveis.

Vivo e respiro Matinha o tempo todo. Acordo pensando, e durmo do mesmo jeito. Meu cotidiano se apresenta em caminhar até o Mateus da Cohama, consultas, médicos, exames, internet, netflix, escrever textos, politica, politica, tentar terminar o curso… e principalmente, fundamentalmente, excessivamente… lembrar Matinha. Telefono, mando mensagens, recebo e dou informações, tudo em função desse chão querido. O livro O Pequeno Príncipe, de Antonie Saint Exupery, mostra um diálogo entre a raposa e o principezinho. Ao ser perguntada sobre cativar, a raposa responde: é “criar laços”.

Meus laços com Matinha vão muito além do mero cativar, esses vínculos estão no âmbito do eterno, perene, indissolúvel, reproduzindo-se nos mais diferentes aspectos, liames, e facetas que essas palavras exprimem, transcendem, mostram. Deus me permitiu a possibilidade, durante os anos de estada em Matinha, poder tratar com inúmeros e diversos objetos, períodos, desígnios, da convivência humana. Guardando as devidas proporções, pedindo vênia pelo aparente neologismo, é como se várias vidas, fossem vividas numa só.

Nesse sentido, lidei com mulheres, homens, crianças, evangélicos, católicos, ateus, pescadores, lavradores, pais de santos, políticos, aposentados, clientes do BEM – Banco do Estado Maranhão -, hoje Bradesco; funcionários da Prefeitura Municipal, professores, alunos, analfabetos, intelectuais, ricos e pobres. Eventos, ocasiões, dispares, multiformes, em que cada um representava por se só, a efetivação de uma saga. No último dia 15 de maio estive mais uma vez na terra que amo. Desta feita para prestar homenagem, num evento patrocinado pela AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras -, ao confrade Dom Guido Palmas e sua patronesse Raimunda Ferreira Silva, nossa querida Nhadica de Mundico Lima.

Oportunizei nesses quase oito anos de ausência, a divina sensação da recompensa do retorno, desses momentos e peripécias, que o destino tão docemente, preparou pra mim. Inenarrável gratidão. Essa é a sensação que perpassa meu espirito, ao ser abraçado pela irmã já idosa, com quem convivi na Igreja Presbiteriana Independente a vida inteira, dizendo que me ama; ou quando aquele garoto que vi crescer, e praticamente ensinei a pescar, fala animado sobre seus feitos, neste inverno cheio de peixes e lembrando de mim; ainda, a frase daquele amigo que a muito não via, reportando-se ao carinho que sente por esta pessoa, rememorando histórias do nosso passado.

Não há dinheiro que pague os fraternos abraços, os olhares e palavras de afeto, a afirmação do quanto sou, fui importante, em vidas tão distintas no que se refere ao poder aquisitivo, gênero, idade, religião, cor, ou identificação político partidária de conterrâneas e conterrâneos. Na condição de estudante de filosofia, faço menção a maiêutica, expressado ao ato de parir, tornado conceito primordial, pelo maior dos filósofos, Sócrates. Ela permitiu, ao nascer na “mata pequena”, a apropriação do meu ser por essa terra e povo, num vínculo tornado indissolúvel, através das correntes de um amor sem limites ou igualdade.

Evoco Chico Buarque, na belíssima canção Fado Tropical: ó musa do meu fado, ó minha mãe gentil…. Matinha, é minha musa maior, razão dessa ânsia em escrever e tornar visíveis meus textos, levá-los a posteridade. Não quero que a passagem para outra vida, tolha ou esconda a significância desse amor que arde em mim. Como bom Calvinista, acredito nas doutrinas da predestinação e eleição, e igualmente ao reformador suíço, tenho certeza absoluta na suprema soberania de Deus. Ele nos fez e conduz nossos passos eternamente.

Ao Altíssimo portanto, toda gratidão e louvor pela vida que me foi oferecida. Por ter nascido em Matinha, tido o privilégio de viver neste tempo histórico, sendo amado e respeitado por esse maravilhoso povo.

João Carlos da Silva Costa Leite é cronista e escritor, natural de Matinha – MA. Bancário aposentado, casado, presbítero em disponibilidade da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB). Membro do Fórum em Defesa da Baixada Maranhense (FDBM). Membro fundador da Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras (AMCAL), ocupando a cadeira de número 17, cuja patronesse é sua mãe, Maria Jose da Silva Costa Leite. Graduando em Filosofia pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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