Pesquisadores da UFMA alertam para as consequências do descarte irregular de resíduos sólidos em SL e na Baixada Maranhense

O descarte inadequado de resíduos sólidos é um problema global, mas suas implicações locais exigem esforços urgentes para a busca de soluções. Embora o Brasil possua a Lei nº 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e que contém instrumentos importantes para o enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos, o cenário ainda é desafiador para gestores públicos e sociedade civil.

Lixão na cidade de Pinheiro

Em São Luís, pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Extensão, Pesquisa e Ensino em Geografia (Lepeng) e no Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGGEO) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) tem revelado consequências devastadoras devido ao descarte inadequado e à gestão ineficiente de resíduos sólidos.

Traçando uma rota de estudos voltados para os resíduos sólidos há cerca de dois anos, Helton Rodrigues Oliveira, discente do curso de Geografia da UFMA, busca entender as condições físicas, demográficas e humanas de um dos bairros da capital maranhense, a Areinha, mapeando pontos de descarte recorrente (chamados de pontos viciados) e suas consequências, como obstrução de drenagens e vulnerabilidade ambiental. O bairro já apresenta outras problemáticas, como as valas de drenagem de esgoto, que transformam essas áreas mais vulneráveis a ser ponto de descarte.

“O bairro foi escolhido levando como foco os inúmeros pontos de descarte irregular que nós temos no bairro e as problemáticas ambientais decorrente disso. Então, o meu trabalho vem realmente caracterizar tanto os aspectos físicos do bairro, quanto os aspectos humanos, demográficos, tudo isso. Eu faço todo um apanhado para levar em consideração como isso tem afetado a vida da comunidade”, explica.

A pesquisa, intitulada “Fatores geográficos no descarte irregular de resíduos sólidos em pontos viciados no bairro da Areinha, São Luís – MA”, está em fase de conclusão, mas já aponta para os desafios da gestão de resíduos em São Luís, potencializados pelas chuvas. Entupimento de bueiros, inundações e a proliferação de doenças ocasionadas pelo descarte inadequado, afetando ecossistemas costeiros, como igarapés e manguezais, com impactos na biodiversidade e saúde pública.

Pesquisadores da UFMA visitaram cidades da Baixada

“A partir do momento que é feito o descarte irregular desses resíduos, eles acabam obstruindo os bueiros, as redes de drenagem, e isso vai afetar a ocorrência de maiores inundações e alagamentos. E também acaba sendo propício para a proliferação de vetores de doenças, como o mosquito aedes aegypti, a partir do momento em que ele acumula água. Outra característica são os nossos aspectos geográficos. Nós moramos em uma ilha, então acaba que, quando nós fazemos o descarte incorreto, a força da água, da chuva, acaba levando esses resíduos para dentro dos rios, nós temos vários que cortam o nosso município, e vai acabar no mar, afetando por atingir os nossos igarapés e o mangue, que são ecossistemas extremamente vulneráveis, ecossistemas costeiros vulneráveis, e que acabam tendo afetada a sua rica biodiversidade”,

Os resultados preliminares foram obtidos pela observação direta e pelo mapeamento espacial utilizando geoprocessamento e sensoriamento remoto. Helton diferencia pontos de descarte simples de pontos viciados, baseando-se na recorrência do uso desses locais para descarte, mesmo após limpeza pública.

Conscientização Ambiental

Com o cenário apontado pelo estudo, a pesquisa ganha também um viés de denúncia, evidenciando a necessidade de diálogo entre comunidades, poder público e organizações civis para criar soluções sustentáveis. Helton destaca a relevância de políticas ambientais adequadas e mapeamento espacial preciso para tratar o descarte irregular, considerando as características específicas de cada local, enfatizando que soluções para o problema devem incluir educação ambiental, especialmente nas escolas, para promover mudanças a longo prazo, e alerta para a importância de políticas públicas contínuas e sustentáveis, em vez de iniciativas pontuais e transitórias.

“O descarte irregular de resíduos não tem apenas características estéticas, não é apenas pontual daquele local, ele é um problema de saúde pública, e acaba que nós precisamos conscientizar as pessoas das formas corretas e ambientalmente adequadas de fazer esse descarte. A gente precisa ter uma comunicação e um diálogo entre os órgãos civis organizados, nós precisamos ter um diálogo maior entre o poder público e também entre as comunidades, para que nós tenhamos um ambiente que seja mais propício a ser mais saudável também para essas pessoas. […] Então, o meu trabalho tem muito a ver a isso, de dar visibilidade, dar apoio a uma comunidade que por vezes é silenciada”, destaca Helton.

Uma gestão eficiente dos resíduos sólidos, por parte do poder público e da sociedade, é fundamental para a qualidade de vida em ambientes urbanos, especialmente diante das mudanças climáticas.

Os desafios ainda são grandes

O Estado do Maranhão ainda enfrenta desafios significativos, sendo o último no ranking nacional de coleta e destinação de resíduos. O estado possui apenas um aterro sanitário, atendendo São Luís e a região metropolitana, enquanto os demais municípios utilizam lixões, uma prática insustentável e inadequada.

Apesar de a Política Nacional de Resíduos Sólidos criar metas importantes que visam à eliminação dos lixões e institui instrumentos de planejamento nos níveis nacional, estadual, microrregional, intermunicipal e metropolitano e municipal, muitos municípios ainda estão em andamento com seus Planos de Gerenciamento de Resíduos Sólidos ou só existe do ponto de vista formal e muito pouco na prática.

“Em São Luís, nós temos até algum avanço com relação à questão da coleta. Na coleta domiciliar existe um avanço. Mas o Estado do Maranhão está em último lugar no ranking, com relação à coleta, os lixões nos municípios do interior do estado são muito fortes. A política deveria ser formalizada nos municípios e cumprida”, observou Giovanny Cid dos Santos Castro, egresso do PPGGEO e autor da pesquisa “Atuação dos catadores de materiais recicláveis e reutilizáveis a partir da experiência da ASCAMAR em São Luís-MA”.

João Pedro Moreira Soeiro, mestrando do PPGGEO, que tem pesquisado no município de Viana, na Baixada Maranhense, ratifica o déficit da implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. “Trabalho principalmente na região da Baixada. Especificamente, no município de Viana. Mas, acompanhando outros colegas que trabalham na região da Baixada, nós observamos que grande parte dos municípios não tem essa política implementada. É uma carência ainda muito forte no Estado do Maranhão como um todo. Isso dificulta principalmente na parte das diretrizes que precisam ser de fato implementadas”, pontua João Pedro.

Para além do poder público, a sociedade também precisa participar do debate e se conscientizar. É o que acredita Giovanny Cid: “Eu acredito que a importância da pesquisa envolvendo resíduos é chamar a atenção da sociedade [também]. Observar como estamos construindo essa relação inclusive com a natureza de uma forma geral. Seja a partir de como trata o resíduo. E aí ela vai e acaba jogando fora, achando que está se livrando de uma forma. Mas vai sofrer as consequências, obviamente, desse descarte inadequado. Ou da falta de políticas públicas voltadas para essa questão. Chamar atenção também para a importância da coleta seletiva. Então, nós temos uma taxa de coleta seletiva muito baixa, menor que 1%. Nós poderíamos ter até mesmo uma profissionalização dentro dessa área. Pensando na geração de renda, trabalhando melhor com os catadores e as associações. Equipando, garantindo as condições mínimas”.

A importância das pesquisas

Para o coordenador do Lepeng, Márcio Celeri, os projetos relacionados à tematica resíduos sólidos desenvolvidos no Lepeng e no PPGGEO são de grande relevância para o avanço da pesquisa acadêmica no Maranhão, já que, por meio desses projetos, são desenvolvidos estudos detalhados sobre as dinâmicas do manejo de resíduos sólidos, identificando desafios e propondo soluções inovadoras e sustentáveis para a região.

“A produção científica gerada pelos discentes de iniciação cientifica e mestrado em Geografia contribui para a formulação de políticas públicas embasadas em dados concretos, possibilitando uma gestão mais eficiente e ambientalmente responsável dos resíduos sólidos urbanos, promovendo uma compreensão aprofundada das particularidades geográficas e sociais do estado”, pontua o docente.

Márcio também enumera os benefícios das pesquisas no contexto do ensino: “as pesquisas oferecem oportunidades valiosas para a formação de estudantes e profissionais qualificados nas áreas de geografia, gestão ambiental e políticas públicas. Elas proporcionam uma vivência prática das problemáticas reais enfrentadas pela sociedade maranhense, permitindo que os discentes desenvolvam habilidades técnicas e analíticas essenciais para o mercado de trabalho. Assim, além de contribuir para o fortalecimento da pesquisa e extensão, os relatórios colaboram para a construção de um Maranhão mais sustentável, promovendo melhorias na qualidade de vida da população e o desenvolvimento socioeconômico da região”.

Os projetos também exercem um impacto direto sobre as comunidades locais ao promover a conscientização ambiental e o engajamento da população na busca por práticas mais sustentáveis de gestão de resíduos. “A interação entre Universidade e sociedade fortalece a capacitação de gestores públicos e atores sociais envolvidos na cadeia de resíduos sólidos, estimulando a criação de cooperativas e práticas de reciclagem que geram emprego e renda. Além disso, as pesquisas possibilitam a articulação entre municípios, incentivando a implementação de consórcios intermunicipais para otimizar recursos e garantir melhores condições sanitárias para a população da Baixada Maranhense e da capital, São Luís”, conclui o coordenador, observando as pesquisas já desenvolvidas ou em andamento que abrangem São Luís e a Baixada Maranhense.

Para enfrentar a problemática do descarte dos resíduos sólidos e suas consequências é fundamental que o poder público tome a liderança, investindo em educação ambiental, fiscalização, planejamento urbano integrado e planos de adaptação robustos. Além disso, a sociedade deve ser parceira nesse processo, contribuindo com ações individuais e coletivas que fortaleçam a resiliência das cidades. Somente assim será possível criar um futuro sustentável para todos. Texto: Ascom/UFMA

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