Desde 1500, quando aqui aportaram portugueses, capitaneados por Pedro Alvares Cabral, caracterizando aquilo que a história oficial intitulou de descobrimento, que esta nação quase continente, está a reboque dos modismos oriundos de além-mar. O Brasil nunca auferiu características próprias. Somos um povo que vive a mercê dos ditames colonizadores e imperialistas. Primeiro dos portugueses. Após 1808, quando da chegada até aqui da família real, fugindo de Napoleão Bonaparte, e com a abertura dos portos, aos ingleses.
Na segunda metade do século XIX, tornamo-nos vassalos da matriz francesa . Era muito chique, sofisticado, para as elites tupiniquins, reproduzir palavras, frases, substituir nomenclaturas lusófonas, do mesmo modo que fizera antes com os inglês da Inglaterra, por galicismo. Após o início do século XX, o poderio gaulês perdeu vigor, passando o protagonismo para uma nova cultura, que perduraria sua influência até os dias de hoje, a ianques, dos Estados Unidos da América . .
A submissão social, econômica, intelectual, cultural, filosófica, cientifica, etc…começa desde o descobrimento. O Brasil em que pese sua extensão quase continental, alcançou muito tardiamente espaços necessários para o crescimento civilizatório. Universidades, indústrias, libertação da escravidão negra, república, medicina, direitos humanos, avanços em todas as áreas, só aqui desembarcaram depois de já terem ocorrido na maioria das nações do novo mundo . Assim mesmo, a história nos ensina, nem sempre de modo verdadeiro, espontâneo, merecido, e sim para convergir ou corroborar com interesses de quem sempre nos governou, a elite branca, rica, cristã.
O escritor, jornalista e dramaturgo, Nelson Rodrigues, cunhou uma frase, um conceito, que ficou famosa ao representar esse fenômeno que torna submisso o povo brasileiro:” complexo ou síndrome de vira lata”, a expressão condensou-se, ao nosso perfil, o “ jeitinho brasileiro”, transformou-se, condensou-se, simplesmente em viralatismo.
Destarte, devido a genialidade de Nelson Rodrigues, pudemos verbalizar um sentimento, que já perpassou, penetrou e está arraigado sociológica, antropológica e filosoficamente neste país. O viralatismo é amplo, versátil, insano, compulsivo. Fomos ensinados, treinados, a renegar, repudiar, menosprezar, tudo que tem origem nacional, em concomitância endeusamos, celebramos, o que vem do exterior, confirmando o que João Ubaldo Ribeiro, Sergio Buarque de Holanda e Florestan Fernandes, ícones da sociologia, escreveram.
O Brasil não é uma pátria de fato e de direito, somos um aglomerado de pessoas sem rumo, temos um passado nebuloso, movido por fatores externos que influenciam o presente. Consequentemente, não nos permitindo autonomia no futuro. Com o advento da internet, e o acirramento da globalização, vivemos um ambiente de quase exaustão. Verbetes estrangeiros invadem, pululam em nosso léxico.
São inúmeras as exibições do viralatismo tupiniquim, expressam-se das mais diversas formas, em todas as faixas, temáticas, falas, produtos, atitudes do nosso tecido social. Alguns de tão arraigados, são transmitidos por gerações, sendo até mesmo aportuguesados. Fazem parte do linguajar cotidiano. Um exemplo clássico é futebol, originalmente uma palavra inglesa chamada football. Esporte que chegou ao país em 1894 através mãos de Charles Miller, logo virando atração nacional.
Curiosamente, o football, metamorfoseado no brasileiríssimo nome futebol, é o único produto que inverteu o processo do viralatismo, transformando além da designação do esporte, todo o anglicanismo a ele relacionado, em palavras verdadeiramente destas plagas. Vocábulos anteriormente usados, foram gradativa e definitivamente substituídos, goal kiper, virou goleiro; right – back e left – back , laterais direitos e esquerdos; fulback, zagueiro; centre Half, médio volante; centre forward, centroavante; corner, escanteio; ofside, impedimento; etc…
Atualmente a linguagem futebolística, o jargão, como falam os estudiosos, está repleto de frases e termos do mais puro português brasileiro. É muito difícil se encontrar um que fuja a regra. Já nas outras áreas, fervilham locuções alienígenas. Informática e economia possuem um arsenal imenso, para os leigos é o mesmo que um dialeto novo, diferente.
É uma trajetória de completa submissão , sem nenhuma perspectiva de mudança. Incorporamos plácida e obrigatoriamente as locuções, proposições, nas conversações e tarefas do dia a dia, quase automaticamente. Bombardeados pelas propagandas nas rádios, TV, internet, painéis de rua (autdoor). Alguns vernáculos soam de forma tão natural, que nem percebemos: pizza, talvez seja um dos mais antigos. De origem italiana, nunca traduzimos para o português esse pão de trigo arredondado, assado no forno, contendo queijo, presunto, tomate, dentre outros temperos.
A lista é grande, já saem dos lábios e dos pensamentos de modo inconteste, sabemos a definição, aprioristicamente: impeachment; abajour; blecaute, apagão; dial,; refil; shonping center, pet shop, coffe break, e-mail, self service, delivere, look, baby doll, barman, bouquet, hobby, sutian, kit, online, live, uber, mega, monark, smoking, sony, feed back, of, on, show, feeling, diet, ligth, fashion, playlist, etc… são só alguns casos.
Chama atenção também as situações dos nomes próprios. Não citarei exemplos, para não ficar de mal com gente próxima a mim, até mesmo parentes. Mas todos conhecemos um número grandioso de famílias com prenomes sem nenhum resquício de brasilidade na pronúncia e na grafia. Citaria ainda o caso de alguns produtos, notadamente na área de agroindústrias ou de abate de aves, suínos e bovinos. Em que peças, pedaços de seus corpos, perdem o nome nativo, incorporando uma nomenclatura nova, nas prateleiras, aliás, gondolas, dos supermercados, ou hipermercados, estabelecidos nos shopping centers, pra usar uma linguagem bem viralatista.
Não sentimos vergonha em comer o velho toucinho de porco defumado, se ele for chamado de bacon; frangos, galinhas, denominam-se chiken, ou chesteres. Até o velho e saboroso camapu, tão conhecido na nossa infância, que nascia facilmente em qualquer monturo ou roçado no interior, ostenta a sofisticada designação de physalis, uma referência ao seu nome científico. Physalis angulata.
Seguimos assim, um povo pujante, com capacidade de desenvolvimento e de tornar-se exemplo ao mundo. Resultado de inúmeras etnias, somos alegres, receptivos, vibrantes, inteligentes. Carregamos, no entanto, desde a nossa gênesis, esse complexo de vira latas. Um mal que manieta, amarra, tolhe, nosso conceito de nação.
João Carlos da Silva Costa Leite, nascido em Matinha, bancário aposentado , estudante do curso de Filosofia da UFMA. Membro fundador da AMCAL , Academia Matinhense de Ciências , Artes e Letras onde ocupa a cadeira 17.
Essa tragédia produziu a “elite” do atraso que pulula por aquia até os dias atuais…O Brassil só fichará livre desse viralatismo quando as massas cumprirem a missão histórica da própria libertação…..